Tudo que em mim sente casa.

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Eu que sou teto, paredes, portas e janelas. Ou estou dentro. Dela, a casa. Aqui se sente a casa. Sinestesia familiar, barulhos de sons que detalham as relações. A sala flutua e eu logo preencho aquela infiltração ali tímida em cima do quadro. Ela me faz mover os braços como se fosse. Invisível pra quem tranca a porta. Observe bem aquela chave debaixo do tapete, do contrário serei eu a correr com a cabeça e a língua revelando os escombros da noite mal dormida, do café repassado. E do bom dia. Esse serve de braços, e seus tantos abraços. Felicidade existe e sabe-se movimentá-la, doce e lentamente pelo espaço. Por este corredor que movimenta a chegada dos braços até os pés, que passaram na ponta dos pés aos pés do ouvido. Segredo. O cofre me faz ter a própria obsessão de não falar. Movimente os ralos, abra os buracos e dance. Serei eu o próprio "Bem-Vindo" posto a estranheza muda da porta de entrada. Passos que fazem músicas aos canos abafados pelo piso debaixo do tapetedo, e da sua enorme tremedeira nos ombros, os pisos se descolam do chão, as lâmpadas piscam os olhos para o porta-retatro gozando de memória, todos sabem. Aquele travesseiro já marcou o formato do rosto dele, que queria ser aquilo, dela que poderia ter feito isso. Sinto-me deslizar. Colar as costas no chão e rir como aquele bilhete na geladeira. Movimentos pequenos ,é claro. Há sutilezas que esbanjam sons coloridos no jogo-de-taças-de-prata. Enrola a cabeça para não ver e fica tão pequeno que vira partícula de tapete sujo, voa por cima da mesa de jantar, passa pela poeira esquecida no canto de armário de cima e abra os abraços para entrar mergulhando no buraco da fechadura. Os ventiladores gemem um canto gregoriano irritante e persistente enquanto eles transam. As traças me deram carona para galopar. A nuca sobre as costas, abrir a boca girar e se sentir batedeira. É BA-te-dei-ra. Fragmentado mesmo. Decepado e dividido entre tantas sensações dela, a casa. Meu corpo que sente que molha que desloca que apaga a luz ao sair e não se sai. Eu que projeto o projeto da casa. Visto de cima assim, voando sobre estruturas tão concretas, tão frágeis.

1 Comentário:

Caio Riscado disse...

eis que nasce nosso homem casa, nosso corpo lar, nosso objeto morada.

 

©2011 CACO - possível produção de memória para o espaço da casa | Realizadora Miúda | Design: TNB